“As casas de fora olham-nos pelas janelas” traz-nos camadas do quotidiano, a marca do tempo e a vida doméstica. Aqui é visível uma relação entre a prática artística e o dia-a-dia: a casa é, assim, materializada, apropriada e incorporada no corpo de trabalho como uma extensão da própria vida. Uma casa com vista para o quotidiano que reflete um solitário modo de viver diário. Este espaço, que abriga e protege, está intimamente ligado a todas as nossas memórias e vivências contendo narrativas que evocam cheiros, afetos, sons, texturas, emoções ou sabores que habitam a nossa identidade. Um lugar de abrigo, pertença, proteção e amor mas também um ambiente reconfortante, acolhedor e confortável onde se saboreiam os silêncios. É neste território que se encontra o eu íntimo e o mundo dos outros.
O conjunto de trabalhos “Still Life” remete para uma linguagem Pop – a colagem, o recorte, a repetição, os objetos, a cor, o humor – contaminada pelos slogans de anúncios publicitários e pelas modas efémeras – os variados padrões apresentados no vestuário dos elementos figurativos – que estimulam a fantasia, a liberdade e o prazer das necessidades sociais e das realidades do lar. Transporta a trivialidade do quotidiano: a nossa identidade, as nossas lembranças, os nossos objetos, as nossas marcas e os nossos produtos através de um estilo de vida que invade os hábitos e os comportamentos de consumo dos dias da casa.
A casa é a intimidade. O corpo. As paredes. As janelas.
A série “Entre paredes” apropria-se de azulejos padrão tradicionais de fachadas que se encontram em íntima articulação com o corpo feminino apresentado no interior da habitação. Os azulejos surgem como a pele das casas, tomando com pertinência a sua georreferenciação como forma de identidade da própria obra. A presença arquitetural desta pele exterior permite entrar e olhar para a espacialidade de um lugar imaginário ou real. Assim, esta malha cria um espaço translúcido tornando-nos voyeurs e dando permissão a observar o que está para lá. O ambiente arquitetónico aparentemente vazio entre paredes paralelas evidencia recantos protetores de uma quase solidão, um diálogo interior.
“As casas de fora olham-nos pelas janelas” enraíza-nos no espaço íntimo do quotidiano feminino através de cenografias e objetos vulgares que por momentos adotamos como nossos, multiplicando-se as possibilidades narrativas e permitindo a entrada num universo que nos é familiar. Lara Roseiro
Outubro 2021
O catálogo
AS CASAS DE FORA OLHAM-NOS PELAS JANELAS
Galeria Municipal do Montijo
27 de Novembro 2021 a 15 de Janeiro 2022
O processo
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